Se se morre de amor
Se se
morre de amor! – Não, não se morre,
Quando
é fascinação que nos surpreende
De
ruidoso sarau entre os festejos;
Quando
luzes, calor, orquestra e flores
Assomos
de prazer nos raiam n’alma,
Que
embelezada e solta em tal ambiente
No que
ouve e no que vê prazer alcança!
Simpáticas
feições, cintura breve,
Graciosa
postura, porte airoso,
Uma
fita, uma flor entre os cabelos,
Um quê
mal definido, acaso podem
Num
engano d’amor arrebentar-nos.
Mas
isso amor não é; isso é delírio
Devaneio,
ilusão, que se esvaece
Ao som
final da orquestra, ao derradeiro
Clarão,
que as luzes ao morrer despedem:
Se
outro nome lhe dão, se amor o chamam,
D’amor
igual ninguém sucumbe à perda.
Amor é
vida; é ter constantemente
Alma,
sentidos, coração – abertos
Ao
grande, ao belo, é ser capaz d’extremos,
D’altas
virtudes, té capaz de crimes!
Compreender
o infinito, a imensidade
E a
natureza e Deus; gostar dos campos,
D’aves,
flores,murmúrios solitários;
Buscar
tristeza, a soledade, o ermo,
E ter o
coração em riso e festa;
E à
branda festa, ao riso da nossa alma
fontes
de pranto intercalar sem custo;
Conhecer
o prazer e a desventura
No
mesmo tempo, e ser no mesmo ponto
O
ditoso, o misérrimo dos entes;
Isso é
amor, e desse amor se morre!
Amar, é
não saber, não ter coragem
Pra
dizer que o amor que em nós sentimos;
Temer
qu’olhos profanos nos devassem
O
templo onde a melhor porção da vida
Se
concentra; onde avaros recatamos
Essa
fonte de amor, esses tesouros
Inesgotáveis
d’lusões floridas;
Sentir,
sem que se veja, a quem se adora,
Compreender,
sem lhe ouvir, seus pensamentos,
Segui-la,
sem poder fitar seus olhos,
Amá-la,
sem ousar dizer que amamos,
E,
temendo roçar os seus vestidos,
Arder
por afogá-la em mil abraços:
Isso é
amor, e desse amor se morre!
DIAS, Gonçalves. Antologia poética.
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