Coliseu, Cecília Meireles
Cem mil pupilas houve: - cem mil pupilas fitas na arena. Os olhos do Imperador, dos patrícios, dos soldados, da plebe. Os olhos da mulher formosa que os poetas cantaram. E os olhos da fera acossada, do lado oposto. Os olhos que ainda brilham fulvos, agora, na eternidade igual de todos. Cem mil pupilas: - ilustres, insensatas, ferozes, melancólicas, vagas, severas, lânguidas... Cem mil pupilas vêem-se, na poeira da pedra deserta. Entre corredores e escadas, o cavo abismo do úmido subsolo exala os soturnos prazeres da antiguidade: Um vozeiro arcaico vem saindo da sombra, - ó duras vozes romanas! - um quente sangue vem golfando, - ó negro sangue das feras! um grande aroma cruel se arredonda nas curvas pedras. - Ó surdo nome trêmulo da morte! (Não cairão jamais estas paredes, pregadas com este sangue e este rugido, a garra tensa, a goela arqueada em vácuo, as cordas do humano pasmo sobre o último estertor...) Cem mil pupilas ficam aqui, pregadas nas pedra...