Eu tenho um bugre dentro de mim
Eu
tenho um bugre dentro de mim, tenho...
Sinto-o
nesta paixão antiga por caçadas,
no
prazer infantil de andar no mato,
na
profunda afeição pelas coisas agrestes.
Nasci
nas matas do rio Doce.
“Minha
bisavó foi pegada a laço”...
Talvez
seja por isso que não gosto de arranha-céus,
estes
jequitibás mortos, sem folhagens
no
carrascal das cidades.
Não
gosto de apartamentos onde o ar
só
entra pelos conta-gotas das janelas;
não
gosto de asfalto, deixa o solo
sem
poros, como cicatrizes de queimaduras;
nem de
estradas eu gosto,
lembram
cadáveres congelados...
Eu
tenho um bugre dentro de mim,
diluído
no meu sangue, tenho...
Sinto
que ele me arrasta
para a
fragrância balsâmica das matas,
para a
música das cachoeiras,
para as
noites leitosas de luar,
para a
majestade serena dos grandes rios,
para o
marulhar constante dos regatos,
para o
verde dos mares,
para o
azul dos céus,
para o
silêncio repousante dos lagos adormecidos...
Ainda é
ele, o bugre, que me impele
para a
árvore de junco do teu corpo,
para os
galhos roliços dos teus braços,
para a
floresta escura dos teus cabelos,
para as
águas dormentes dos teus olhos,
para o
fruto vermelho da tua boca,
para os
passarinhos que cantam na tua voz...
Eu
tenho um bugre dentro de mim, tenho!
Por
que, Senhor! Não fiquei só no bugre?...
No
bugre livre de selo,
livre
de folhinha,
livre
de relógio,
livre
de roupa...
No
bugre livre! Livre! Livre!
(Demóstenes
Cristino)
Comentários
Postar um comentário