Os Cinco Motivos da Rosa - Cecília Meireles
Primeiro Motivo da Rosa
Vejo-te
em seda e nácar,
e tão de
orvalho trêmula,
que penso
ver, efêmera,
toda a
Beleza em lágrimas
por ser
bela e ser frágil.
Meus
olhos te ofereço:
espelho
para a face
que
terás, no meu verso,
quando,
depois que passes,
jamais ninguém
te esqueça.
Então, de
seda e nácar,
toda de
orvalho trêmula,
serás
eterna. E efêmero
o rosto
meu, nas lágrimas
do teu
orvalho... E frágil.
Segundo
Motivo da Rosa
(a Mário
de Andrade)
Por mais
que te celebre, não me escutas,
embora em
forma e nácar te assemelhes
à concha
soante, à musical orelha
que grava
o mar nas íntimas volutas.
Deponho-te
em cristal, defronte a espelho,
sem eco
de cisternas ou de grutas...
Ausências
e cegueiras absolutas
ofereces
às vespas e às abelhas.
e a quem
te adora, ó surda e silenciosa,
e cega e
bela e interminável rosa,
que em
tempo e aroma e verso te transmutas!
Sem terra
nem estrelas brilhas, presa
a meu
sonho, insensível à beleza
que és e
não sabes, porque não me escutas...
Terceiro
Motivo da Rosa
Se Omar
chegasse
esta
manhã,
como
veria a tua face,
Omar
Khayyam,
tu, que
és de vinho
e de
romã,
e, por
orvalho e por espinho,
aço de
espada e Aldebarã?
Se Omar
te visse
esta
manhã,
talvez
sorvesse com meiguice
teu
cheiro de mel e maçã.
Talvez em
suas mãos morenas
te
tomasse, e dissesse apenas:
“É curta
a vida, minha irmã”.
Mas por
onde anda a sombra antiga
do amargo
astrônomo do Irã?
Por isso,
deixo esta cantiga
- tempo
de mim, asa de abelha -
na tua
carne eterna e vã,
rosa
vermelha!
Para que
vivas, porque és linda,
e contigo
respire ainda
Omar
Khayyam.
Quarto Motivo da Rosa
Não te aflijas com a pétala que voa:
também é ser, deixar de ser assim.
Rosas verá, só de cinzas franzida,
mortas, intactas pelo teu jardim.
Eu deixo aroma até nos meus espinhos
ao longe, o vento vai falando de mim.
E por perder-me é que vão me lembrando,
por desfolhar-me é que não tenho fim.
Quinto
Motivo da Rosa
Antes do teu olhar,
não era,
nem será depois, -
primavera.
Pois vivemos do que
perdura,
não do que fomos.
Desse acaso
do que foi visto e
amado: - o prazo
do Criador na
criatura...
Não sou eu, mas sim o
perfume
que em ti me conserva
e resume
o resto, que as horas
consomem.
Mas não chores, que
no meu dia,
há mais sonho e
sabedoria
que nos vagos séculos
do homem.
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