O cavalo e o burro - Monteiro Lobato

            O cavalo e o burro seguiam juntos para a cidade.  O cavalo contente da vida, folgando com uma carga de quatro arrobas apenas, e o burro — coitado!  gemendo sob o peso de oito.  Em certo ponto, o burro parou e disse:
            — Não posso mais!  Esta carga excede às minhas forças e o remédio é repartirmos o peso irmãmente, seis arrobas para cada um.
            O cavalo deu um pinote e relinchou uma gargalhada.
            — Ingênuo!  Quer então que eu arque com seis arrobas quando posso tão bem continuar com as quatro?  Tenho cara de tolo?
            O burro gemeu:
            — Egoísta!  Lembre-se que se eu morrer você terá que seguir com a carga de quatro arrobas e mais a minha.
            O cavalo pilheriou de novo e a coisa ficou por isso.  Logo adiante, porém, o burro tropica, vem ao chão e rebenta.
            Chegam os tropeiros, maldizem a sorte e sem demora arrumam com as oito arrobas do burro sobre as quatro do cavalo egoísta.  E como o cavalo refuga, dão-lhe de chicote em cima, sem dó nem piedade.
            — Bem feito!  exclamou o papagaio.  Quem mandou ser mais burro que o pobre burro e não compreender que o verdadeiro egoísmo era aliviá-lo da carga em excesso?  Tome!  Gema dobrado agora…


LOBATO, Monteiro. Fábulas. São Paulo: Brasiliense, 1994.


Comentários