Poeta cristão - Rubem Braga


A poesia anda mofina,
Mofina, mas não morreu.
Foi o anjo que morreu:
Anjo não se usa mais.
Ainda se usa estrela
Se usa estrela demais.

Poeta religioso
Mocinha não pode ler
Pecará em pensamento,
Que o poeta gosta do Novo.
Mas pilha seus amoricos
É o Novo Testamento.

Ai, o Velho Testamento!
Eu também faço poema,
Ora essa, quem não faz:
Boto uma estrela na frente
E u pouco de mar atrás.

Boto Jesus de permeio
Que Deus, nos pratos de mar,
É um excelente recheio.
E isso bem posto e disposto
Me vou aos peitos da Amada:
Sulamita, Sulamita,
Por ti eu me rompo todo,
Sou cavalheiro cristão.
Minh’alma está garantia
Num rodapé do Tristão
E o corpo? O corpo é miséria,
Peguei doença, mas Jorge
De Lima dá injeção!

O badalo está chamando,
Bão-ba-la-lão.

Amada, não vai lá não!
Eu também tenho badalos –
Bão-ba-la-lão!

Eu sou poeta cristão!


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